Atrasos nos pagamentos, pandemia e os novos riscos

Pouco tempo após a declaração de pandemia e das medidas que decretaram o primeiro estado de emergência, a Informa D&B realizou uma análise de impacto setorial, identificando a intensidade com que os impactos desta crise se fazem sentir nos diversos setores de atividade. Percebemos também que esta crise afeta as empresas de forma bastante desigual, com setores bastante mais expostos do que outros
POR
 TERESA CARDOSO DE MENEZES

Os setores mais expostos aos impactos da pandemia são os que estão a aumentar mais significativamente os dias de atraso nos pagamentos aos seus fornecedores.

Já sabemos que o atraso nos pagamentos é um dos fenómenos que, há demasiado tempo, atinge em profundidade o tecido empresarial português. Existe transversalmente em todos os setores, com consequências em cascata, pondo em risco a sobrevivência de muitas empresas, sobretudo as de dimensão mais reduzida.

No final de 2020, apenas 16% das empresas cumpria estes prazos, valor que apesar de ter recuperado quase dois pontos percentuais no último ano, fica muito aquém da média europeia, que é de 44,3% de empresas cumpridoras. Além disso, e ainda comparando com os nossos parceiros europeus, desde 2015 que é visível na Europa um movimento crescente desta percentagem de cumpridoras, exatamente o mesmo ano em que ela recomeçou a cair em Portugal.

Também é verdade que em Portugal cerca de dois terços dos casos onde se verificam atrasos não vão além dos 30 dias. No entanto, os constrangimentos que as empresas enfrentam hoje, em consequência da pandemia de Covid-19, introduzem um novo sinal de alarme, precisamente no que diz respeito aos dias de atraso.

Pouco tempo após a declaração de pandemia e das medidas que decretaram o primeiro estado de emergência, a Informa D&B realizou uma análise de impacto setorial, identificando a intensidade com que os impactos desta crise se fazem sentir nos diversos setores de atividade. Percebemos também que esta crise afeta as empresas de forma bastante desigual, com setores bastante mais expostos do que outros.

Alguns meses depois, o que constatamos é que os setores mais impactados são também aqueles onde a média de dias de atraso nos pagamentos mais cresceu. O exemplo mais dramático é protagonizado pelo alojamento e restauração, o setor mais afetado pela pandemia e em que o número médio de dias de atraso nos pagamentos já é de 36,8, tendo crescido mais de sete dias desde fevereiro de 2020.

A leitura regional que fazemos dos atrasos nos pagamentos é consistente com a leitura setorial. As três regiões com menor percentagem de empresas cumpridoras são a Madeira, Lisboa e o Algarve, todas muito dependentes de atividades relacionadas com o turismo. Foi também nestas três regiões que mais cresceu desde fevereiro de 2020 o número médio de dias de atraso.

Os riscos associados ao incumprimento dos prazos de pagamento ficaram ainda mais claros após termos criado o novo Indicador de Resiliência Financeira, que avalia a capacidade das empresas enfrentarem um choque excecional e não previsto com impacto significativo na sua atividade.

Segundo a nossa análise, quase metade das empresas revela uma resiliência financeira que as ajudará a ultrapassar este momento. No entanto, quando cruzamos este indicador com o Risco de Delinquency – ou seja, a probabilidade de uma empresa incorrer em atrasos nos pagamentos superiores a 90 dias nos próximos 12 meses -, constatamos que 12% das empresas representam um maior risco, ou porque têm níveis de resiliência mais reduzidos, ou porque registam um Risco Delinquency mais elevado.

São estes riscos que devem ser identificados quando se tomam decisões, nomeadamente decisões de crédito comercial, pois o atraso nos pagamentos é um sinal de debilidade e risco para todo o tecido empresarial, que necessita de atenção especial por parte de todas as empresas.